Apenas uma caixa
Sentada na varanda enquanto saboreio o meu indispensável cafezinho após o almoço, observo o plátano que no quintal do vizinho, cresce sem pedir licença erguendo-se cada vez mais alto, perdendo-se no espaço azul a que chamamos céu que, com a sua ramagem verde e densa me proporciona deliciosas sombras quando o calor aperta. Em contrapartida me cobra a vista do mar mesmo ao longe e as vistas das aldeias vizinhas! É assim o plátano do vizinho, me dá umas coisas e me tiras outras! Quando os ramos crescem tanto que entram pelo meu quintal dentro, pego numa tesoura e corto-os. Isto acontece quando estamos na Primavera e no Verão porque, quando o Outono chega e já se faz anunciar a chegada, as suas folhas demasiado maduras, acastanhadas e ressequidas, caem em abundância, roupagem velha, talvez inútil, coisa que ninguém quer, ou ...talvez queira.... a utilidade como fertilizante poderá ser um dos seus destinos. Mas a folhagem inútil ou reutilizável inunda todo o meu espaço, o vento as leva daqui para ali e é escusado andar atrás delas, porque saem umas e logo vêem outras, até que a árvore fica indefesa, despida, qual esqueleto dissecado e, esguio aponta os seus braços ao céu, suplicando que venha a Primavera para se vestir de novo!
Lá em baixo o portão da garagem está aberto, o vento sopra, as folhas redopiam numa dança embalada pela música do vento e, sem autorização, empurradas, atropelando-se umas contra as outras entram portão adentro, qual alegre brincadeira de crianças se divertindo sem preocupações!
A garagem cheia de folhas obriga-me a pegar na vassoura e varrer.... quando dou por mim, estou a vasculhar gavetas na arrecadação, que não são abertas há anos e encontro algo que me faz recuar no tempo.
Aquela tampa vermelha, ali na minha frente, instantaneamente me leva ao tempo de menina, quando o meu pai me ensinou o valor do dinheiro e de como era importante saber poupar. Aquela caixinha foi o meu primeiro mealheiro, ela me ajudou a perceber desde cedo que nunca se deve gastar tudo!
Guardamos coisas porque achamos que um dia nos poderão fazer falta ou porque encerram memórias que não queremos que desapareçam com o tempo! o facto de ter guardado a caixinha branca com tampa vermelha, mesmo esquecida na arrecadação foi precisamente para perdurar a memória que dela ficaria. É apenas uma caixa sem qualquer valor, eu sei. Mas se pensarmos que somos nós que atribuímos o valor às coisas mediante a importância que elas têm para nós, chegamos à conclusão que o que para uns é lixo, para outros são bens com bastante utilidade mesmo que se trate "apenas" de memórias! E as memórias fazem parte da nossa identidade!
Memórias será um tema para uma futura publicação!