O dia amanheceu com chuviscos, mas já sabia que ia ser assim, com a previsão meteorológica no telemóvel a todo o momento, e eles raramente falham, sabemos sempre o que o tempo vai fazer nas horas seguintes. Assim, melhor esquecer a praia e arranjar outro modo de ocupar o tempo neste mês de Agosto, amanhã estará céu azul e sol quente! viver perto da praia tem estas vantagens! Mesmo em tempo de pandemia, a vila fervilha de gente, o comércio precisa de girar, as pessoas também, faltam é certo, os estrangeiros, que em Verões normais nos fazem quase esquecer que estamos em Portugal, mas este é um verão atípico e eles, os estrangeiros ficaram nos seus países! Mas a vila está repleta de portugueses, isso é bom, muito bom! por vezes digo para mim mesma que a Divina Providência se encarrega de colocar as coisas no devido lugar quando tudo se encontra a ultrapassar as estribeiras, e o mundo estava a ultrapassar e muito os limites, era necessário haver um travão, e ele apareceu fazendo o mundo quase parar e recuar!
Assim sendo, chovia e eu queria sair, então fui até à vila me misturar nos muitos portugueses que mesmo à chuva passeavam, fui só mais uma que passeou à chuva, mas a temperatura estava amena e a chuva era fraca, por isso foi bom. Depois entrei numa esplanada, pedi um café que bebi sem açúcar, fiquei a observar os passeantes e a comparar mentalmente as suas formas de vestir, de andar, de comunicar e, constatando que dentro de cada individuo existe uma vida e uma forma diferente de ser! todos somos irremediavelmente diferentes, cada um é um ser único na sua forma de pensar, de sofrer, de ser feliz, de se relacionar com os outros... Estava eu neste devaneio quando de sentou na minha mesa uma amiga acabada de chegar, e ali ficamos na conversa durante um bom bocado, falando de tudo e de nada enquanto a chuva miudinha caía lá fora. Assim se passou uma tarde de chuva em Agosto!
O empreendedorismo e os pequenos negócios ganharam muito terreno após a crise de 2008, foi sem qualquer dúvida um período muito conturbado na nossa era, uma era muito recente que está ainda bem presente na nossa memória. Ainda assim foi uma época em que Portugal soube tirar partido disso e aproveitar para para oferecer ao mundo o que de melhor tem, o nosso sol, clima, paisagem, cultura, gastronomia e tantos outros produtos que fazem de nós um país escolhido pelo turismo. Portugal se reinventou para melhor! Foi sem dúvida o turismo que impulsionou a nossa economia nos últimos dez anos, assistimos a uma baixa considerável da taxa de desemprego, e tudo parecia estar bem agora, até que, surge este monstro que estraga tudo.... e vai obrigar Portugal a se reinventar de novo!
Toda esta introdução para chegar ao Padeiro da minha rua, um dos pequenos negócios que após muitos anos de interrupção voltou a ganhar forma e espaço nos nossos dias. Todos os dias o padeiro ou vendedor de pão passa na sua carrinha branca bem identificada com uma bonita decoração e um nome sugestivo, nela transporta pão e bolos de várias qualidades que vai vendendo a cada vez mais clientes (explica ele, que vai ter que comprar uma carrinha maior) porque os clientes são cada vez mais; sem grande alarido vai apitando para avisar que está a chegar, parando aqui e ali para deixar o pão aos clientes. E porque, com os vendedores ambulantes, os clientes trocam quase sempre dois dedos de conversa, nesses dois dedos de conversa fiquei a saber que o padeiro da minha rua, agora em tempos de pandemia, tem o dobro do trabalho, o que me leva a dizer que "nunca é mau para todos", há sempre quem tenha que trabalhar mais para que aos outros nada falte!
Da minha varanda observo a rua, tudo parece igual a ontem, a mesma estrada ladeada de casas amarelas, azuis ou brancas, os passeios para caminhar, algumas ervas surgem aqui e ali, os pássaros cantam, a chuva caiu e as plantas revigoraram, as laranjeiras estão floridas, as andorinhas começam a abeirar-se dos seus ninhos, uma ou outra pessoa passa, tudo parece realmente igual a ontem; no entanto, quando olho as pessoas, nada é igual a ontem, os seus olhares, as suas preocupações e receios estampam-se nos rostos, nas palavras, na incerteza de um futuro que ninguém sabe onde nos conduz. Ontem os carros circulavam uns atrás dos outros numa pressa sempre desenfreada, as pessoas numa correria para o trabalho, para as compras, para levar e buscar as crianças da escola, era uma vida, achávamos nós, completa, sem tempo para nada, sem tempo para os filhos, para os pais, para os vizinhos, para os amigos, o tempo não chegava e dávamos por nós a pedir mais tempo ao tempo e o tempo nunca chegava!
Hoje o tempo sobra para quem tem que fazer quarentena ou isolamento social, palavras pouco usuais no nosso vocabulário de ontem, o tempo sobra mesmo apelando à imaginação e criatividade na tentativa de reinventar outra forma de viver, outra forma de fazer as coisas, outra forma de comunicar e demonstrar os afectos e carinhos pelos outros.
As noticias cansam, os números cansam, a nossa capacidade de ouvir sempre as mesmas noticias esgota-se, em cada novo dia temos esperança que os números apresentem sinais de abrandamento que nos acalme o espírito, sabemos que esse dia chegará, mas quando não sabemos!
Todos os que estão na linha da frente (frente de batalha) porque esta pandemia provocada pelo virús covid-19 é uma guerra sem igual da qual ninguém está livre, todos os que estão na linha da frente num combate levado à exaustão para salvar vidas, arriscando em cada hora, em cada minuto a sua própria vida, merecem todo o apoio e solidariedade do mundo. Eles sim são os Grandes Heróis nesta guerra, e a nós que estamos no isolamento social eles só pedem que Fiquemos em casa. Tão simples comparado com a luta deles. Pensando neles devemos fazer o que nos pedem para que eles possam tratar de nós!