Qual será afinal o nome mais apropriado para a mala de uma mulher? aceitam-se palpites. Para mim é: saco-leva-tudo. Se bem que este até dá medo, pelo que nem dá vontade de meter nada dentro desta boca de raia que tem ar de engolir tudo.
Eu que tenho tanta estima pelos meus óculos de sol, pela maquilhagem de retoque, pelos blocos de apontamentos e canetas, pelos pacotinhos de açúcar que vou confeccionando de cada vez que bebo uma bica, pelo porta moedas, pelo porta documentos pelas chaves do carro e de casa e mais a garrafinha da água e de tudo o resto que vai lá para dentro sobre o qual aqui nem se fala. Não faltando o telemóvel claro está. Nada me encoraja a meter seja o que for dentro desta dita coisa.
E como esta boca de raia não me convence, acho que me vou limitar a uma pochet que só leva umas moedinhas mais uns lenços de papel!
Uma prenda deliciosa de alguém que passou por Aveiro e se lembrou de mim, porque sabe que gosto dos sabores e das texturas dos doces tradicionais, então trouxe para me oferecer, "Ovos Moles de Aveiro"
Iria dizer "uma pequena delícia" mas não, não vou dizer isso, vou antes dizer "uma Grande delicia" estes Ovinhos Moles de Aveiro", OBRIGADA
"Os Ovos Moles de Aveiro foram criados no século XVI, no Convento de Jesus de Aveiro. Essa iguaria compõe a grande tradição portuguesa dedoces conventuais, receitas originadas em conventos e mosteiros do país.
Os Ovos Moles são feitos com a mesma massa da hóstia, por influência conventual, que é moldada em formas que remetem ao mar e à tradição piscatória de Aveiro, como peixinhos e conchas. E, por dentro, um maravilhoso doce de ovos moles.
Os Ovos Moles de Aveiro foram até citados no livro Os Maias, de 1888. O autor Eça de Queiroz escreveu: “São seis barrilinhos de ovos moles de Aveiro. É um doce muito célebre, mesmo lá fora. Só o de Aveiro é que tem chic”.
Enquanto mergulho as mãos na água quente e lavo os pratos do jantar, ao mesmo tempo que ouço aquela pinga teimosa que cai naquele sitio sempre que chove, e o vento que fustiga lá fora abanando os ramos das árvores, vou pensando no que raio vou eu escrever sobre a proposta desta semana para o "desafio de escrita do triptofano" que apresenta uma carta cujo código é difícil de decifrar.
Vejo ali umas prateleiras repletas de frascos e garrafas, também uma moldura que encaixa uma fotografia de uma criança, talvez o filho do homem que se debruça sobre as combinações dos líquidos de forma a encontrar a fórmula perfeita do medicamento que lhe foi proposto realizar.
Imagino um local pequeno, escuro e frio, o sitio a que ele chama laboratório onde trabalha à luz da vela entre produtos quentes e frios, gasosos e não gasosos, uns químicos, outros adquiridos através de plantas, no caderno vai anotando todos os pormenores conseguidos e falhados para perceber onde pode melhorar ou o que tem de eliminar definitivamente. Aquele cérebro não pára. A ciência não pode parar.
A certa altura a mesma criança da fotografia aparece sorrateiramente à porta e diz:
- Pai, a mãe diz que são horas de parares, que são horas do jantar
- Sim, responde sem levantar os olhos do que estava a fazer, diz à mãe que vou mais tarde.
A criança sai pela mesma porta por onde entrou e ele não mais se lembrou que precisava de comer.
Tudo está devidamente rotulado e a foto da criança também se encontra em cima da mesa para lhe dar mais incentivo e coragem para continuar nas suas experiências.
A noite já vai alta, ele também se esquece que precisa de descansar, o seu metabolismo desregulado não o avisa dessas coisas tão próprias de qualquer ser humano e quando chega a manhã, o jantar ainda está em cima da mesa à sua espera e o seu lado da cama ainda está frio.
Esta foi mais uma noite que não foi à cama, a fórmula certa está difícil de encontrar, e ele é daquelas pessoas que não sossega, não dorme e não come enquanto não consegue obter o seu objectivo.
Abri a janela para ver a chuva cair, a musicalidade que aos meus ouvidos chegava das grossas pingas a cair do beiral do telhado, indiferentes se eram bem vindas ou não, da água a correr pelo pátio abaixo, deslizando suavemente entrava direitinha no reservatório que está abaixo do solo. No quintal os feijões acabados de serem semeados recebiam esta abençoada chuva, que os iria fazer germinar dentro de pouco tempo.
Adoro ver as plantas que sulcam timidamente a terra tal como uma criança que se anuncia nascer, resultante das sementes que cuidadosamente deixei cair. Começam a surgir um pouco envergonhadas, apenas uma pontinha verde desponta de inicio mas depois começam a crescer de dia para dia até se tornar numa planta grande, florir e deixar desabrochar o legume próprio da sua natureza.
Hoje o céu enegreceu, as nuvens tornaram-se densas e escuras e a chuva do céu caiu, como uma bençao, da janela eu via a chuva cair na estrada e a água a saltitar em cima dos carros, estes com o limpa para brisas a funcionar afastavam a chuva que lhes batia nos vidros.
Também aquela senhora caminhava de guarda chuva aberto se resguardando da chuva, os sapatos chapinhando na água, estaria feliz por finalmente poder caminhar enquanto chove? Também ela sentirá como eu que chegamos à primavera sem ter havido Inverno?
Da minha janela senti o cheiro a terra molhada, senti o ar mais limpo e isso deixou-me feliz. Não necessito de coisas muito elaboradas para ser feliz, o facto de ver a chuva cair, sentir o cheiro da terra molhada enquanto se atravessa uma seca severa é motivo suficiente para me sentir feliz!
Não fosse o facto de alguém me ver e dizer que enlouqueci, iria para o meio da rua sem guarda chuva abarcar esta chuva nos meus cabelos, no meu rosto, no meu corpo e dizer "Obrigada" (É claro que logo de seguida iria para o duche para aquecer)!